Palavras e contrapalavras: resistências [Caderno de estudos XII]

Grupo de Estudos dos Gêneros do Discurso – GEGe/UFSCar

R$32.00

APRESENTAÇÃO

Nosso Grupo de estudos – Grupo de estudos dos Gêneros do Discurso (GEGe/UFSCar [leia-se GEGê, com acentuação no final), vem se reunindo desde 2002, de forma ininterrupta, quase sempre à sombra do Abakhtin, um frondoso abacateiro que havia nos pátios do Departamento de Letras, na Universidade Federal de São Carlos/UFSCar, depois substituído por uma jovem e vigorosa castanheira, hoje uma árvore enorme. Também crescemos nesse tempo. Muita leitura, de muitas obras; muitos livros traduzidos; muitos eventos realizados; muitos livros escritos; muitas dissertações, teses, trabalhos de conclusão de cursos, artigos; encontros com pesquisadores nacionais e internacionais; pesquisas; aulas; cursos; mini-cursos, pós-doutorados, viagens. Uma vida, vivida em um círculo de amigas e amigos que estudam juntos, em interação, em relação.

Hoje nosso círculo, grudado a tantos outros círculos, não tem mais uma sombra única, mas está espalhado, disperso por várias universidades, e diversas cidades e estados. Somos muitos. Ainda aprendemos juntos.

Nesse ano de 2020, ano I da pandemia mundial, que tantas vidas ceifou prematuramente, também vivemos nosso isolamento na luta pela sobrevida nossa e dos que dividem o tempo e o lugar conosco. E vivemos nosso isolamento na sólida resistência. RESISTÊNCIAS. Todas. Resistindo o tempo todo.

Resistimos nos encontrando. Também aderimos à nova árvore tecnológica, e abrimos semanalmente uma sala de conversa no Meet, e todas as sextas-feiras à tarde lá nos abraçamos, e rimos, e passamos a tarde refletindo, discutindo, estudando e aprofundando a compreensão de algum texto bakhtiniano e, principalmente, da vida.

Entendemos que o que importa é a vida. Vida que se dá na relação. Vida que é dialógica por natureza. Vida que é onde os eventos únicos e singulares se dão. Vida onde se dá a constituição do eu e do outro. Vida onde damos um passo, vida onde respondemos. E nossa resposta é nossa resistência. É nosso jeito de cumprirmos nosso dever, dever único, e que somente pode ser respondido de uma forma única, singular. Vida onde nossa contrapalavra é enunciada o tempo todo. Vida onde não temos como fugir, onde nos esconder, como passar nosso ato único a outro… Vida que somente nós podemos viver, e nenhum outro em nosso lugar… Assim, desse lugar singular, somente meu, tenho que fugir tanto do individualismo, de viver uma vida onde eu somente seja o centro de valor, apagando o centro de valor do outro, como fugir do universalismo, como se todas as vidas fossem a mesma coisa, apagando a singularidade de cada um.

A existência de dois centros de valor, o centro de valor do outro e o centro de valor do eu, muda tudo em nossa vida. Existe o outro! Ele é o ponto de partida. E juntos vamos nos constituindo, fugindo tanto do “excedente do outro”, quando ele estabelecesse domínio sobre 0 eu, constituindo um eu dominado, diminuído, apequenado, sem palavras próprias, quanto do “excedente do eu”, quando o eu subalternizasse o outro, o dominasse por inteiro, tirasse seu valor, sua palavra. A vida se dá na relação, tensa, mas amorosa. Amorosa porque dá conta de ver o outro, de perceber as suas nuances específicas, seu jeito único de ser, dá importância à diferença, até a exigindo, e consegue viver a diferença de forma não-indiferente. Amorosa porque luta para garantir o lugar do outro, ambos vivendo com excedente na relação com o outro, sem domínio, mantendo os espaços de existências únicas, necessárias por serem únicas, e precisando realizar seus atos responsáveis, exatamente por serem únicas; e se não realizarem seus atos responsáveis ninguém mais os vai poder realizar… Tamanha responsabilidade, e não dá pra escapar… Tem que realizar! Tem que resistir. Tem que dizer a palavra própria, só sua, com seu cheiro, sua direção ideológica, seu jeito de encarar o mundo.

Resistimos compreendendo que precisamos totalmente do outro, que o outro é o único em condições de nos livrar da cadeia inescapável da identidade, do individualismo. Ele é que nos pode “capturar” pra alteridade, pra uma vida de relações, de atenção ao outro, de escuta. Escutar o outro não é uma disposição nossa, que fazemos quando queremos, ou quando bem entendemos. Escutar o outro, se colocar em relação com o outro é nosso estado “natural”. Nossa individualidade é social. Assim, escutar é sair dessa cadeia; escutar é resistir ao individualismo, é buscar a palavra outra e constituí-la como palavra própria, nesse momento contínuo de encontros de palavras, encontros de resistências, de constituição do novo, do por-vir, a partir de um “horizonte de possibilidades” colocados pelo outro.

Ao escrever, em plena pandemia, sobre Resistências, é também sobre essas questões que estamos pensando, e olhando pra várias direções. Que nossos escritos também te ajudem a pensar sobre outras formas de resistência. Resistir é nosso “estado natural”, resistir é se colocar no jogo social. Resistir é escrever tua história com o outro. Não fuja! Mostra tuas RESISTÊNCIAS!

Valdemir Miotello

Ano de lançamento

2020

Formato

ISBN

978-65-5869-044-3

Número de páginas

397

Organização

Grupo de Estudos dos Gêneros do Discurso – GEGe/UFSCar