(Em) Serra de Maracaju, Sonhos Guaranis

Flávio Zancheta Faccioni

PREFÁCIO

Entre grafismos, tatuagens e cicatrizes: a história, memória e cultura de Mato Grosso do Sul

por Claudete Cameschi de Souza

Mais bonito que o canto dos pássaros são seus voos.
Nem todo canto é de alegria, mas todo voo é de liberdade.
(Mario Quintana)

O pesquisador, apaixonado pela música sul-mato-grossense, ao dizer sobre as composições musicais de Paulo Simões e Almir Sater e de Geraldo Espíndola, sinaliza a construção cultural de Mato Grosso do Sul. Para Flávio Zancheta Faccioni, os compositores, instrumentistas e cantores, influenciados por ritmos diversos e inspirados pela presença marcante dos povos originários nessa construção, contam e cantam a simplicidade, os mitos, as tradições, a saga, a luta desses povos e sua contribuição na formação do povo sul-mato-grossense. E Flávio canta e encanta com uma linguagem “poético-acadêmica” que expressa um olhar, um sentimento de mundo, a emoção de uma alma alimentada pelo som, pelo ritmo… pela viola… por meio de uma singularidade expressiva que o marca como o cantar daquele rouxinol que entoava seu canto pela janela do palácio.

Mas, como Quintana adverte: Mais bonito que o canto dos pássaros são seus voos. Nem todo canto é de alegria, mas todo voo é de liberdade, sim, a feitura deste texto marca os rastros de um caminhante em busca do canto e da liberdade e que acredita fugir dos moinhos de ventos3 . Porém, provoca a ventania e a tempestade em um gesto interpretativo das músicas: Sonhos Guaranis e Serra de Maracaju de Paulo Simões e Almir Sater; e Kikio, de Geraldo Espíndola, que, de algum modo, cantam a busca da liberdade e/ou a falta dela em terras sul-mato-grossenses.

Assim como um camaleão, Flávio é perpassado pela linguagem poética das músicas, que deixam rastros das dores da falta de si mesmo, e a linguagem acadêmica, que presentifica o aqui e agora4 daquilo que um dia representou uma única possibilidade, a área de Letras, mas que lhe abriu caminhos e possibilitou grafismos e tatuagens a partir de cicatriz de una letra que no está escrita / El punto suspensivo, el interrogante / Una curva que no avisa / Un olor en el eco / Un territorio que se agita5 . Macaco, em La huella6 , diz que a liberdade é Las ramas de un árbol bailando en los brazos del tiempo / Un paso que no se olvida7 . As experiências de Flávio deixam emergir sinais, pegadas, marcas, bajo la piel [que] son [sus] historias tatuadas8… grafismos, tatuagens e cicatrizes.

Grafismos são traços desenhados sobre a pele, em geral, com corantes naturais de pouca duração pelos povos originários e marcam um ritual, um momento festivo, guerras e lutas de resistência e (re) existência, que, mesmo permanecendo pouco tempo na pele, jamais são esquecidas, pois habitam a memória ancestral desses povos (Kikio). Tatuagens são escolhas de registros sobre a vida, as vivências, os sonhos, a busca rebelde da juventude pela liberdade… assinalados na pele e de longa duração (Serra de Maracaju). Cicatrizes assemelham-se às tatuagens, mas nem sempre são escolhas. São feridas que sangram ainda abertas e às vezes [nos] deixa[m] assim … a pensar talvez nas escolhas incertas ou na falta delas (Sonhos Guaranis).

Flávio chegou aqui com [seus] próprios pés , em um voo de busca pela liberdade… E hoje [tem sua] raiz . Tatuou-se da cultura e das músicas de Mato Grosso do Sul, foi atravessado pelos ritmos, pela beleza da terra, pela história e pela memória da formação do povo e da criação do estado e deixou nascer, aflorar, emergir sua narrativa (que também é de todos nós que habitamos o texto), contando e cantando a cultura e os processos identificatórios dos sul-mato-grossenses. Nas palavras de Elias J. Torres Feijó (2022), […] uma narrativa… que se relaciona com uma comunidade… que é elaborada por ela… que… ao mesmo tempo explica e é explicada e que se vincula a um território… a um espaço… modo de ver… de interpretar e de funcionar nesse mundo como comunidade…, como referente… como narrativa e que traz elementos basilares do que podemos dizer que é a cultura e identidade Mato-grossense do Sul.

 

Ano de lançamento

2022

ISBN [e-book]

978-65-5869-848-7

Número de páginas

153

ISBN

978-65-5869-847-0

Autoria

Flávio Zancheta Faccioni

Formato