Linguística Aplicada e Hispanismo

Organização: Antonio Ferreira da Silva Júnior

PREFÁCIO

Recebi com muita alegria e honra o convite para prefaciar a obra ´Linguística Aplicada e Hispanismo´, organizada pelo Prof. Dr. Antonio Ferreira da Silva Júnior, por quem tenho grande admiração, e é fruto das discussões gestadas na disciplina Linguística Aplicada e Estudos Hispânicos do Programa de PósGraduação em Letras Neolatinas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no primeiro semestre de 2020. A obra conta com onze capítulos, que nos permitem um panorama de temas de interesse contemporâneo da área da Linguística Aplicada e, em especial, ao hispanismo brasileiro.

Pesquisas anteriores (SOTO, 2004; PARAQUETT, 2012; MATOS, 2013; PARAQUETT, SILVA JUNIOR, 2019; SILVA JÚNIOR, 2020) levantaram e analisaram dados sobre os estudos hispânicos em publicações e na produção científica no âmbito da Pós-graduação brasileira, além de relacionar à área da Linguística Aplicada e alguns caminhos puderam ser trilhados sobre nossa história. Paraquett, por exemplo, (2012, p. 230) apontou sobre a nossa ausência em publicações da área da LA, dizendo que “nenhum de nós saiu naquela foto”, mas aqui nesta obra vemos uma foto com diversos pesquisadores que se dedicam à Linguística Aplicada (LA) em sua vertente atual.

Em uma publicação anterior (MATOS, 2013), também apontei que nós ainda precisávamos ganhar mais espaço nas pesquisas e publicações em LA, mostrando para a academia o muito que temos feito, não somente por questões geopolíticas, mas profissionais, culturais e sociais. Ocupar espaços no cenário das pesquisas brasileiras é também uma forma de diálogo com as demais línguas que se ensinam e circulam em nosso país, contribuindo para a pluralidade linguística e a criação de espaços de resistência.

Assim, vejo com muita positividade e avanço o desenvolvimento de pesquisas voltadas ao espanhol na área da LA, como as apresentadas neste livro, que conta com resultados de investigações, experiências e reflexões sobre os estudos hispânicos em nosso país. Muitas temáticas são abordadas, dentre elas: Políticas Linguísticas; Formação Docente; Identidades Culturais; Identidade Bilíngue; Representação; Currículo; Materiais Didáticos; Multiletramentos e Educação Linguística; Literatura. Ao folhear o livro, podemos passear por alguns temas que já possuem um caminho sólido nas pesquisas em LA e outros que se destacam nas últimas décadas. Assim, a obra tece uma diversidade de temáticas, ao tempo em que nos atualiza sobre alguns dos interesses atuais de nossa área.

Destaco que os capítulos se pautam em uma agenda de Linguística Aplicada que parte, também, da preocupação com as vozes do sul, promovendo um espaço de escuta, não de objetos de estudo, mas de agentes e produtores de conhecimento que antes não eram ouvidos, de maneira a romper processos de colonialidades. É o que podemos perceber em vários dos capítulos que trazem uma LA da desaprendizagem, crítica e suleada. E pergunto: O quê precisamos desaprender para poder sulear nossa perspectiva dos estudos da linguagem? Os capítulos nos ajudam a pensar em caminhos para essa agenda crítica e não mais se curve às epistemes norteadas, subvertendo os lócus epistêmicos de produção de conhecimento e visibilizando epistemologias e ontologias outras.

Dentro desse contexto, esse livro é de relevância por trazer textos de estudantes de mestrado e doutorado, pesquisadores hispanistas e que dão maior visibilidade à nossa área, dentro da LA. É importante o espaço que o Prof. Antonio cria para que possamos dialogar com suas pesquisas no atual contexto em que vivemos. Não posso deixar de mencionar que passamos por uma pandemia de COVID-19, que deixou muitas sequelas e nesse momento precisamos tomar fôlego para seguir nossas pesquisas e divulgar o que temos produzido, como forma de resistência, tão necessária em nossos tempos de incertezas. É uma maneira de construir alternativas e caminhos outros para a produção de conhecimentos que se ressignificam em nossas práxis.

Nesse sentido, destaco o papel das Associações e Programas de Pós-graduação no fomento e divulgação de pesquisas em seus espaços de discussão, como temos nessa obra. Pensar o caráter político de nossas pesquisas, é também divulgá-las, ampliando o escopo e o espaço das diversas línguas dentro da LA, colocando o plurilinguismo em destaque no nosso contexto latino-americano, em especial, o espanhol.

Quando menciono o plurilinguismo, é importante pontuar que as atuais políticas educacionais e linguísticas de nosso país sofreram um retrocesso. Pensando no caso específico do espanhol, a Lei 13.415/2017 nos trouxe um cenário de crise, revogando a Lei 11.161/2005, conhecida como a Lei do Espanhol e determinando que os currículos do Ensino Médio incluam obrigatoriamente o inglês e, em caráter optativo, preferencialmente o espanhol. No Ensino Fundamental, é determinado que, a partir do sexto ano, deve ser ofertada apenas a língua inglesa.

É evidente que diversos contextos de nosso país não são considerados, como as zonas de fronteira, contato entre línguas, as práticas translíngues, nas quais o espanhol está presente. E não somente o espanhol, mas diversas outras línguas, como as decorrentes dos processos migratórios e as de povos originários de nosso continente. As pesquisas em LA podem contribuir com essas questões, auxiliando a compreender as práticas sociais e políticas como inseparáveis, destacando o papel da linguagem em seus diversos imbricamentos. Nesse sentido, a LA vem mostrando, há alguns anos, sua mudança de paradigmas de pesquisa para além do que ocorre no contexto escolar, expandindo seus interesses para outras esferas em que a linguagem tem papel central.

Para finalizar, lanço o meu olhar para os próximos anos que estão por vir, desejando que cada vez mais pesquisas preocupadas com sua relevância social possam ser desenvolvidas na área de Linguística Aplicada no Programa de Letras Neolatinas da UFRJ e nos demais Programas de nosso país. Que continuemos partindo de epistemologias que entendam a linguagem como central em nossas práticas sociais e que cada vez mais os estudos hispânicos se fortaleçam, divulgando uma agenda de Linguística Aplicada atenta às especificidades de nosso contexto latino-americano. Estamos na foto e sairemos cada vez mais.

Profa. Dra. Doris Cristina Vicente da Silva Matos
Universidade Federal de Sergipe

Referências

MATOS, D. C. V. S. A linguística aplicada no Brasil e as pesquisas em língua espanhola. Revista Inventário (Universidade Federal da Bahia. Online), v. 1, p. 1-11, 2013.

PARAQUETT, M. A língua espanhola e a linguística Aplicada no Brasil. Revista Abehache. São Paulo: ABH, v. 1, n. 2, p. 225-239, 2012.

PARAQUETT, M.; SILVA JUNIOR, A. C. O cenário escolar e acadêmico do Brasil antes e depois da “Lei do Espanhol”. Revista Abehache, n. 15, p. 69-86, 2019.

SILVA JÚNIOR, A.F. Relações e avanços entre a Linguística Aplicada e o hispanismo no Brasil. Raído, Dourados, v. 14, n. 36, p. 310-333, dez. 2020. SOTO, U. Strictu Sensu: regularidades e dispersão na pesquisa em língua espanhola. In: PARAQUETT, M.; TROUCHE, A. (orgs). Formas & Linguagens. Tecendo o Hispanismo no Brasil. Rio de Janeiro: CCLS, 2004, p. 155-178.

Ano de lançamento

2022

Número de páginas

263

ISBN

978-65-5869-798-5

ISBN [e-book]

978-65-5869-814-2

Organização

Antonio Ferreira da Silva Júnior

Formato