Camadas populares e universidades públicas: trajetórias e experiências escolares

Débora Cristina Piotto

PREFÁCIO

A questão das diferentes probabilidades de acesso e de sucesso dos indivíduos na escola, segundo sua origem social, constitui uma preocupação quase obsessiva da Sociologia da Educação, desde, ao menos, os anos 1950/1960. Nessa época, surgiram nos Estados Unidos, na França e na Inglaterra as primeiras pesquisas empíricas sobre as desigualdades sociais de oportunidades em relação à escola.

A partir dos anos 1980, surge, sobretudo na França, um conjunto de trabalhos sociológicos que propõe uma nova abordagem do fenômeno das desigualdades escolares, tentando quebrar o determinismo das análises anteriores, que consistia em reduzir toda a explicação sobre os diferentes percursos acadêmicos ao pertencimento de classe dos alunos. Sem negar as grandes regularidades estatísticas, essas pesquisas tomam por objeto os destinos escolares atípicos, excepcionais, inesperados ou, mais precisamente, as histórias singulares de jovens socialmente desfavorecidos que obtêm êxito nos estudos. Seu objetivo último é conhecer as condições sociais que possibilitam trajetórias escolares incomuns ou, em outros termos, compreender como o improvável se torna possível. Ao estender o campo de observação sociológica, tais investigações demonstram que uma trajetória escolar é fruto de uma combinação complexa de fatores (estruturais, familiares, pessoais) e que ela não se reduz a um único fator explicativo, nem a uma simples adição de fatores. Assim, uma importante mediação se interpõe entre a origem social e o destino escolar.

No Brasil, a meu conhecimento, foi a dissertação de mestrado de Écio Antônio Portes, defendida na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1993, que abriu caminho para estudos desse tipo, os quais foram, sem dúvida, estimulados e reforçados com a tradução e publicação, em 1997, do livro de Bernard Lahire, Sucesso escolar nos meios populares: as razões do improvável. Na esteira desse movimento, seguiram-se vários trabalhos de teses e dissertações, dos quais cito apenas alguns: as teses de doutorado de Maria José Braga Viana (1998), de Wânia Maria Guimarães Lacerda (2006), de Débora Cristina Piotto (2007), de Maria do Socorro Neri Medeiros de Souza (2009) e a dissertação de mestrado de Wilson Mesquita de Almeida (2006), todos eles autores presentes nesta obra e que já vêm sendo associados, no país, a essa promissora temática de pesquisa que muito tem contribuído para afinarmos nossa compreensão das desigualdades de escolarização.

A presente coletânea vem, muito auspiciosamente, atualizar o leitor quanto às linhas de evolução desse trabalho, num contexto educacional de expansão do ensino médio e, sobretudo, de criação de novas oportunidades de acesso e permanência no ensino superior – através de políticas como o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) ou de ações afirmativas – para jovens dele excluídos num passado ainda muito recente. A ideia de abordar um aspecto da questão – o ingresso e a experiência escolar em instituições de ensino altamente seletivas que, no Brasil, são representadas pelas grandes universidades públicas – parece-me de grande relevância, pois contribui para alargar nossa compreensão das lógicas que regem essa forma de inclusão educacional.

Tenho certeza de que este livro será muito útil para todos aqueles que se interessam pelo tema das desigualdades sociais de acesso ao ensino superior, no país, bem como pela nova conjuntura de relativa abertura desse nível do ensino a novos grupos sociais.

Maria Alice Nogueira
Faculdade de Educação – UFMG

Ano de lançamento

2021

ISBN

978-85-7993-194-9

ISBN [e-book]

978-65-5869-332-1

Número de páginas

274

Organização

Débora Cristina Piotto

Formato