Estudos do texto e do discurso: o discurso em contrapontos: Foucault, Maingueneau, Pêcheux.

Organização: Edson Carlos Romualdo, Ismara Tasso

APRESENTAÇÃO

Este livro completa o sexto volume do projeto editorial da Linha de Pesquisa “Estudos do Texto e do Discurso”, do Programa de Pós‐graduação em Letras da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Soma‐se aos volumes anteriores no sentido de responder a diferentes inquietações teórico‐analíticas que concernem ao estudo da linguagem, ora tomando o texto, ora tomando o discurso como seu objeto. Em seu primeiro volume[1] a coleção contemplou o mapeamento de possibilidades conceituais e metodológicas na abordagem dos estudos do texto e do discurso, dado por diferentes perspectivas teóricas; no segundo[2], sob a densidade das instâncias que envolvem objetos de diferentes materialidades, articulou os temas língua(gens), identidade e memória; sob a égide complexa que orienta as relações entre política e mídia na contemporaneidade, o terceiro volum[3]3 trouxe à discussão modos de discursivização midiática de algumas políticas, deu ênfase às transformações das práticas discursivopolíticas e proporcionou reflexões da ordem da representação de sujeitos políticos inscritos em processos de midiatização e de espetacularização de acontecimentos políticos; o quarto volume[4] tratou de textos e de discursos de diferentes materialidades cujo foco se deu por unidades tópicas e não tópicas reunidas segundo critérios independentes de fronteiras institucionais prévias; a finalidade maior delegada ao quinto volume[5] foi a de discutir a noção de “prática discursiva”, localizando‐a nos arcabouços teóricos erigidos por Foucault, Pêcheux e Maingueneau.

Este sexto volume, já em seu título quis enfatizar o profícuo contraponto das abordagens discursivas que tomam por base Foucault, Maingueneau e Pêcheux. Três autores fortes, que em suas especificidades nos permitiram interlocuções interessantes no interior do Projeto de Cooperação Acadêmica – PROCAD estabelecido em 2009 entre a UNICAMP e a UEM, e que se encerra neste ano.   Portanto, este livro, o quarto produzido em parceria entre a UEM e a UNICAMP, tem o objetivo de dar visibilidade a diferentes modos pelos quais os pesquisadores que integraram este PROCAD dão consequência ao estudo do discurso.

Os capítulos de Estudos do texto e do discurso. O discurso em contrapontos: Foucault, Maingueneau e Pêcheux, ao se organizarem em torno destes autores, nos levam a pensar no contraponto da teoria musical, no qual as vozes podem trocar suas posições sem infringir as regras da harmonia. A organização deste livro mostra como as vozes desses pensadores do discurso podem sustentar discussões teóricas e análises que, ao se contraporem em suas especificidades, contribuem para o desenvolvimento de tais estudos lançando novas questões e permitindo que as vozes se cruzem em tensões produtivas.

Nesta obra polifônica, a voz de Foucault apresenta‐se nos cinco primeiros capítulos. Neles o leitor encontrará a proposta de um dispositivo teórico‐metodológico de base foucaultiana para analisar a corporeidade da candidata Dilma Rousseff na mídia impressa (SANTOS e ROMUALDO); um percurso traçado pelo gesto descritivo‐interpretativo arqueogenealógico que objetiva compreender como a série enunciativa iconográfica do acontecimento “Brasil, 500 anos” alçou o status de inventário do real, a partir do modo como corpos em vigília foram retratados pela mídia (TASSO); uma análise das condições de possibilidade de a interculturalidade constituir um dispositivo organizador da materialidade discursiva em uma reportagem sobre a cegueira de um menino índio (OLIVEIRA e TASSO); a discursivização do sujeito com deficiência na mídia televisiva, especificamente no que concerne o apelo à emoção, enquanto mecanismo verbo‐visual de identificação que pode apagar, transformar e consolidar ideais modelares de sujeitos, possibilitando‐lhes sua governamentalização (SILVA); e a descrição do desempenho do sujeito responsável socialmente em propagandas governamentais e em campanhas publicitárias que circularam no primeiro mandato do ex‐Presidente Lula, pela retomada das noções de formação das modalidade enunciativas e de enunciado reitor (VOSS e NAVARRO).

No contraponto, a voz de Maingueneau ganha destaque no conjunto, em três capítulos, com a discussão de algumas hipóteses sobre a instabilidade das formações discursivas e esboços de análises de um corpus constituído por cartas de leitores, reportagens, manifestações de “blogueiros” e colunistas sobre o evento de ocupação da reitoria por estudantes da USP (POSSENTI), e com duas propostas analíticas, uma delas baseada na noção de semântica global e outra no conceito de sobreasseveração, mais recentemente desenvolvido pelo teórico francês. A semântica global é utilizada para examinar o entrecruzamento do discurso religioso com o discurso sobre o feminino na revista Visão Missionária, uma publicação da União Feminina Missionária Batista do Brasil (SANTOS); já o conceito de sobreasseveração é o fundamento teórico usado para identificar e categorizar as manobras discursivas que caracterizam os textos noticiosos online sobre os debates político‐eleitorais, mostrando as alterações, silenciamentos, inclusões e inversões de sentidos quando comparados às falas transcritas dos debates (BENITES e ASSIS).

A obra se completa com o momento de realce da voz de Pêcheux, manifesta em sete capítulos, que realizam gestos de leitura de materialidades distintas e discussões teóricas que se baseiam nos pressupostos colocados por este autor. Nesse momento, analisam‐se os modos predominantes de formulação da militância de esquerda e da resistência materializadas no discurso cinematográfico do filme O ano em que meus pais saíram de férias (ALVES e PASSETTI) e os grafites do artista de rua Banksy, que, ao simularem o efeito tridimensional, fazem reverberar sentidos que tem a cidade como pano de fundo (BRASIL). O pensamento de Pêcheux sobre a propaganda aparece na contraposição de um recorte do discurso de um movimento social urbano a um slogan de uma propaganda de campanha política para se discutir os possíveis sentidos de “defender” (MODESTO); e sua perspectiva materialista de discurso serve como ponto de partida, tomando como materialidade o documentário Território Vermelho, para a discussão do movimento de visibilidade/invisibilidade social do corpo urbano como material simbólico (BRANDES). Essa perspectiva discursivo‐materialista pechetiana juntamente com as contribuições de estudos marxistas do direito compõem o referencial teórico para a análise de uma reportagem sobre os direitos indígenas no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (OLIVEIRA, BERLOFFA, SANTOS e NERY).

Ainda na continuidade do momento de realce da voz de Pêcheux na composição deste volume de Estudos do Texto e do Discurso, dois importantes textos do autor – ʺDelimitações, Inversões, Deslocamentosʺ e ʺSó há causa daquilo que falha ou o inverno político francês: início de uma retificaçãoʺ – são trazidos para a discussão do processo de identificação do sujeito na sua realização simbólica.   Partindo da relação entre revolução e linguagem, estabelecese o laço entre incompletude e reconhecimento, passando pela metonímia e pela metáfora, para chegar à identificação tal como a perspectiva materialista do discurso a propõe (LAGAZZI). Finalmente, a discussão de porta‐voz estabelecida por Pêcheux surge no conjunto, para tentar compreender, na literatura de cordel, o modo como a voz do povo circula nesses folhetos e na mídia, indagando sobre a relação entre o poeta de cordel e a figura revolucionária do por
ta‐voz (D’OLIVO).

Como o leitor poderá perceber, os capítulos deste livro, escritos por professores pesquisadores participantes do PROCAD e pós‐graduandos das duas Universidades, em seu conjunto, trazem diferentes olhares discursivos diferentes investimentos teóricos e análises que recortam os materiais mais diversos, mas todos convergem para a preocupação de compreender sujeito e linguagem no jogo da produção dos sentidos, considerando as determinações que enlaçam o social em sua força simbólica.

Maringá/Campinas, junho de 2013.

Suzy Lagazzi,
Edson Carlos Romualdo,
Ismara Tasso

Organizadores

Notas

1 NAVARRO, P. (Org.). Estudos do texto e do discurso: mapeando conceitos e métodos. Claraluz: São Carlos, 2006.

2 TASSO, I. (Org.). Estudos do texto e do discurso: interfaces entre língua(gens), identidade e memória. Claraluz: São Carlos, 2008.

3 POSSENTI, S. ; PASSETTI, M. C. (Org.). Estudos do texto e do discurso: política e mídia. Maringá: Eduem, 2010.

4 POSSENTI, S.; BENITES, S. A. L. (Org.). Estudos do texto e do discurso: materialidades diversas. São Carlos: Pedro & João Editores, 2011.

5 NAVARRO, P.; POSSENTI, S. (Org.). Estudos do texto e do discurso: práticas discursivas na contemporaneidade. São Carlos: Pedro & João Editores, 2012.

Ano de lançamento

2013

ISBN [e-book]

978‐85‐7993‐144‐4

Número de páginas

350

Organização

Edson Carlos Romualdo, Ismara Tasso

Formato