Mulheres debatem Michel Foucault. Vol. II. Dossiê “gênero, loucura, neoliberalismo e resistências”
Organização: Priscila Cupello
Viger sob o registro do Outro, do não, ou da ausência faz parte da condição atravessada por mulheres escritoras. Em um campo consolidado como essencialmente da ordem do masculino, a produção das mulheres ainda perfura estratos de saber-poder que prefiguram um lugar: o da condescendência, dos afetos, da reinvindicação – um uso assim especificado da razão, cujas exigências são ou a anulação de si ou um reforço do que se constituiu como feminino.
Desbravando as históricas demarcações ocidentais do Mesmo e do Outro, Michel Foucault, como um bandeirante às avessas, nos legou as ferramentas de uma crítica que é ao mesmo tempo histórica e prática. Ela constata o que foi feito política e historicamente de nós mesmas, mas abre também janelas de subjetivação contra os assujeitamentos normalizadores. Com Foucault, a partir dele, mas também contra ele, uma geração de intelectuais se une no esforço de revelar o verso do traçado em que o Outro foi bordado. Assim também “a mulher” – segunda, volúvel, marcada pela falta, servil e servente, histérica, “triste, louca, má”.
É que, nessa condição, vibra justamente um todo que é a própria diferença – o que resiste como não-ser-norma, insistindo na transcendência intelectual. É resistir ao diagnóstico, mas é também estimar a prática e a estética do cuidado, a força e a beleza da reprodução, usurpadas pelo Capital, pela desvalorização do que gera e promove vida. Nesse dissidir fundamental, das vozes marcadas historicamente pela opressão, é também como enfrentamento que a escrita se faz forte: na afirmação da liberdade do pensamento contra as assertivas fragmentadoras, neoliberais, individualizantes, identitárias que, alegando reparação, reforçam preconceitos ao dizer às intelectuais sobre o que é legítimo que falem. Sobre o que é legítimo que uma preta fale. Sobre o que é legítimo que uma pessoa divergente fale. Sobre se é legítimo que uma criança fale. Sobre a apropriação que decidimos fazer de nossas lógicas antigas, nossas ancestralidades e mitos fundadores; sobre como decidimos preservá-los, refutá-los ou reescrevê-los.
Nesse volume, mulheres mostram que a fineza de seu trabalho intelectual, filosófico, artístico, sociológico, educacional e político se dá como prática crítica e livre sobre aquilo que lhes move, que é fruto do seu espanto: aquele que nos faz ver e dizer do que é o que é, mas também o que não precisaria ser.
Fillipa Silveira
Professora adjunta do Instituto de Filosofia
da Universidade Federal de Uberlândia (IFILO/ UFU)
Ano de lançamento | 2024 |
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Formato | |
ISBN | 978-65-265-0986-9 |
ISBN [e-book] | 978-65-265-1052-0 |
Número de páginas | 269 |