Travessias luso-brasileiras na educação da infância

Ana Arthur, Cassiana Magalhães

PREFÁCIO

Travessias luso-brasileiras na educação de infância configura-se como uma obra onde a língua portuguesa, comum aos dois países, Portugal e Brasil, acalentou a viagem e cimentou o diálogo, para o mundo da educação da infância. O universo da Lusofonia, como tão bem nos relembra Cristóvão (2003, s. p.), “não é só a soma de territórios e populações ligados pela língua. É também um certo património de ideias, sentimentos, monumentos e documentação.”. Este espaço civilizacional coletivo integra imaginário, arquétipos, cosmogonias, enfim, dimensões simbólicas, éticas e axiológicas significativas profundas.

E assim, comungando a mesma língua, e com ela uma determinada cultura, esta obra debruça-se sobre a educação da infância, já vertida na Declaração dos Direitos da Criança, vinda a lume em 1959, proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas. A criança goza de distintos direitos, de acordo com esta Declaração universal, dentre os quais o Direito à Educação, gratuita, que contribua para a sua construção axiológica e praxiológica. Este documento consagra também que deve ser promovida uma educação que permita à criança “desenvolver as suas aptidões mentais, o seu sentido de responsabilidade moral e social e tornar-se um membro útil à sociedade.” (ONU, 1959, s. p.).

Hoje, a sociedade assiste a transformações complexas, profundas, demandando uma formação e um trabalho exigente aos/às educadores/as de infância. Uma pedagogia para a infância perspectiva a criança como sujeito e agente do processo educativo, tendo esta o direito de participar no desenvolvimento do currículo e de construir a sua própria aprendizagem. Desta forma, uma pedagogia para a infância tem em conta as crianças, a sua voz, e os contextos onde elas se movem, numa relação recíproca, exigindo da parte dos profissionais a definição de finalidades educativas e de projetos pedagógicos democráticos, inclusivos, fundados na cidadania, que considerem a criança como produtora de conhecimento e de formas culturais próprias.

E, se se fizer o exercício de encontrar palavras-chave nos capítulos desta obra, rapidamente se descortina a travessia educativa defendida pelas distintas autoras para a infância. Expressões como Crianças, Corpo, Inclusão, Projeto, Brincar, Repertório Cultural, Literatura, Desenhar, entre outras, marcam uma visão de uma pedagogia para a infância, que se deseja subjacente a um currículo gerido e implementado por equipas educativas, com um sólido construto científico, cultural e profissional.

Ao voltar ao documento Declaração dos Direitos da Criança, percebemos como a Inclusão é matéria de vários princípios, como, por exemplo, logo no número 1: “Estes direitos serão reconhecidos a todas as crianças sem discriminação alguma, independentemente de qualquer consideração de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou outra da criança, ou da sua família, da sua origem nacional ou social, fortuna, nascimento ou de qualquer outra situação.” (ONU, 1959, s.p.). A educação inclusiva revela-se num compromisso com um projeto que conheça, que interpele e que responda, de modo instigante, à diversidade das Crianças, às suas necessidades e expetativas, bem como ao desenvolvimento das suas potencialidades, permitindo a participação equitativa de todas, sem exceção, na vida da comunidade educativa.

Outro princípio forte, enunciado na Declaração e presente na obra, prende-se com o Brincar: “A criança deve ter plena oportunidade para brincar e para se dedicar a actividades recreativas (…)” (ONU, 1959, s.p.). Brincar é sinónimo de criança e de infância. Brincar livremente, numa imersão total nesse espaço/tempo, possibilita à criança explorar, investigar, experimentar outros papéis, testar os seus limites e, devido a tudo isto, construir conhecimento sobre si, sobre o seu Corpo, sobre o outro e sobre o mundo que a rodeia.

Uma pedagogia para a infância tem de contemplar também Projetos que integrem e que promovam um verdadeiro Repertório Cultural, consentindo às crianças um enriquecimento cultural que assuma uma vertente estética, no contacto com distintas linguagens e múltiplos discursos, que lhes proporcionarão uma leitura do mundo. Deste modo, deve fazer-se presente na vida das crianças a Literatura, o Desenho, a pintura, a música, a dança, o teatro, não esquecendo o mundo da ciência e da tecnologia. Aliás, na Declaração dos Direitos da Criança, no seu sétimo princípio, afirma-se mesmo que deve ser “ministrada [à criança] uma educação que promova a sua cultura” (ONU, 1959, s.p.).

De todos estes aspetos trata esta obra, através de vozes polifónicas, talvez num mesmo tempo, mas seguramente em espaços e geografias distintas. Estas conversas contribuirão, certamente, para enriquecer o pensamento e o conhecimento na educação da infância, demonstrando, numa época tão dada a muros, que as pontes são possíveis e as travessias desejáveis, caso queiramos construir um mundo global mais humano.

Ângela Balça
Universidade de Évora / CIEC

Referências

Cristóvão, F. (2003). Os três círculos da lusofonia. Disponível em: https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/artigos/categorias/lusofonias/ostres-circulos-da-lusofonia/102 Acesso em: 23/12/2021

ONU. Declaração dos Direitos da Criança. (1959). Disponível em https://www.dge.mec.pt/sites/default/files/ECidadania/Docs_referencia/declaracao_universal_direitos_crianca.pdf Acesso em: 27/12/2021

Ano de lançamento

2022

Formato

ISBN [e-book]

978-65-5869-813-5

ISBN

978-65-5869-812-8

Número de páginas

196

Organização

Ana Arthur, Cassiana Magalhães