Caminhos entre o eu e o outro na formação inicial de professores: vivências e memórias
Organização: Alita Carvalho Miranda Paraguassú, Silmara Barbosa Alencar
PARA INÍCIO DE CONVERSA
Caro(a) leitor(a), O livro que você tem em mãos, intitulado “Caminhos entre o eu e o outro na formação inicial de professores: vivências e memórias” é um daqueles preciosos estudos que versam sobre formação de professores. E sendo formação de professor um construto de natureza coletiva, essa obra não é diferente. Trata-se de um trabalho feito a várias mãos, resultado de reflexões de quem está se lançando agora na desafiadora missão de se construir (e se reconstruir) enquanto educador e pesquisador. Sob a organização da Jornalista Silmara Barbosa Alencar, cujo trabalho abre a coletânea, e da Professora Alita Carvalho Miranda Paraguassú, que a fecha, o livro é um conjunto de relatos de experiências de estudantes pesquisadores, que a mim agora coube o deleitoso ofício de lhe apresentar.
Entretanto, antes de falar da vivência, vale apresentar inicialmente o contexto a qual as memórias fazem referências. Nos últimos anos, o Brasil tem vivido um dos períodos mais críticos de sua história, em termos educacionais. Além de reduções, contingenciamentos e cortes orçamentários que impediram o cumprimento a contento do Plano Nacional de Educação (PNE) e a devida valorização do docente e dos demais profissionais da educação, políticas educacionais equivocadas tornaram-se algum tipo de desafio em termos de formação docente. E infelizmente, tais desafios não se limitaram à atuação de autoridades políticas. Ressoando discursos, parte de segmentos da própria sociedade incorporou falas extravagantes (como a defesa de homeschooling, escola sem partido, dentre outros aberrações da mesma natureza) que colocaram em cheque o papel essencial da escola na formação de nossas crianças e jovens e a tão cara liberdade de atuação docente.
Nesse contexto obscuro, discutir formação de professor é muito mais que necessário; é um ato de resistência. Essa obra, portanto tem uma relevante contribuição social na medida em que busca desconstruir visões distorcidas, construídas no imaginário de pessoas que se dão o direito de julgarem o fazer pedagógico, sem tão pouco terem vivido ou pelo menos conhecido a realidade escolar. Essa obra, ao contrário daqueles que falam sem conhecimento de causa, que falam de experiências não vividas, traz o olhar de estudantes-professores, que foram para o chão de fábrica, que viveram o evento em sala de aula e que, portanto, nos servem para ponderações, na balança de nosso bom senso.
Mas vale ainda acrescentar, nesta parte da contextualização, que o cenário social complexo em que tal obra foi produzida, recebeu mais um ingrediente desafiador. No ano de 2020, o mundo foi surpreendido pelo surgimento e disseminação da pandemia da COVID-19, que vitimou milhões de pessoas no mundo todo e abalou, em especial, a sociedade brasileira. Ao longo de poucos dias o número crescente de internações e mortes por COVID-19 forçou as autoridades a reconhecerem o estado de calamidade pública e a determinarem lockdown, algo, até então, inédito para esta geração. O fechamento de escolas, a suspensão de calendários escolares e o uso forçado e repentino de tecnologia de informações, dentro de uma perspectiva de ensino remoto emergencial foram elementos que tornaram ainda mais complexo o fazer docente e, em alguns casos, ainda mais precário, tanto para os professores quanto para os estudantes. De qualquer forma, no mínimo tornou o fazer pedagógico ainda mais desafiador.
Pensar em formação docente, em especial formação de professores de língua portuguesa, num contexto atípico como esse, de transição do ensino presencial para algo tão novo e tão desafiador como o uso de ferramentas digitais, e que após a ampliação da vacinação e com quedas de óbitos e internações, forçou-nos a fazer o movimento inverso, ou seja, migrar do remoto a um novo presencial, com cumprimento de uma série de recomendações de biossegurança, é algo de relevância ímpar, por retratar a realidade escolar, num contexto nunca d’antes visto, que poderá deixar sequelas ou contribuições ao ensino (depende do ponto de vista), pelos próximos anos.
Foi neste momento turbulento, tão complexo e diferente, que nasceu a obra que você, caro leitor, tem em mãos. O livro é constituído por 10 capítulos, sendo que 8 deles foram resultados das primeiras experiências docentes que estudantes de um curso de licenciatura em Língua Portuguesa de uma instituição pública federal de ensino goiana tiveram, em virtude de suas participações em programas de Residência Pedagógica (RP), de Iniciação à Docência (PIBID) e de atividades de estágio obrigatório, nesse contexto social de transição a que me referi. Cada capítulo é uma experiência, uma vivência própria, uma reflexão particular do fazer docente. Ao ler toda a obra, nosso olhar se amplia, pois temos a oportunidade de (re) analisar um mesmo objeto, sob perspectivas diferentes, em momentos igualmente distintos.
Numa perspectiva do ensino ainda presencial, Marcos Daniel Carvalho Teixeira nos apresenta um olhar para as práticas educativas de letramento lúdico e literário numa escola da rede pública de Goiânia, em atividade do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID). Tereza Cristina de Oliveira discorre acerca de suas experiências enquanto estagiária Pibidiana em contexto de inclusão, numa busca pelo aprimoramento do fazer docente em sala de aula. Cláudia Juliana Arantes Camargo e Cleidivânia da Silva Lima trazem as reflexões de um trabalho realizado com leitura, interpretação e produção de texto, desenvolvido em uma escola estadual da cidade de Goiânia, em virtude de suas participações no PIBID.
Já num contexto de ensino desenvolvido de forma remota, ao longo da pandemia, as estudantes pesquisadoras Giovanna Moreira Alcântara Gontijo Santos e Marylia Gabriella Alves da Silva apresentam experiências e emoções que tiveram, ao longo do processo de formação docente, enquanto atuaram como estagiárias do PIBID. Na mesma perspectiva, Cleonicy Avelino do Amaral Magalhães traz reflexões acerca da importância do uso de tecnologias e da empatia ao processo de ensino e aprendizagem, em contexto de pandemia. Rita de Cássia Alencar discorre sobre as teorias inspiradoras e práticas pedagógicas, considerando suas experiências em Residência Pedagógica, mas considerando especialmente a realização das atividades de seu estágio supervisionado, neste recorte pandêmico. Lorena Rodrigues Dias constrói reflexões e vivências na construção da identidade docente, enquanto Pibidiana, nesse mesmo contexto histórico, e Elenice Rabelo Costa e Joelma da Silva Barata abordam reflexões construídas a partir da experiência com alunos do Ensino Médio, na elaboração de projeto de vida e cotidiano expressos no gênero textual meme.
O leitor deve estar se perguntando a esta altura, qual foi a motivação para se propor tal obra. A resposta está na história de vida das próprias organizadoras. Profissionais ligadas a uma instituição federal de ensino superior, cujo compromisso é a promoção de um ensino de forma intimamente articulada com a pesquisa e com a extensão, mobilizar um grupo de estudantes de licenciatura a pesquisarem e a produzirem relatos científicos de seus trabalhos está coerente com a proposta de uma instituição de ensino superior séria, a saber, de formar professores-pesquisadores que, para além de ministrar aulas, fazem do trabalho docente seu objeto de estudo. Ensino superior, pautado por essa formação crítica, é emancipador e, claro, transformador.
O livro dá voz e visibilidade a novos pesquisadores, que se lançam ao saboroso desafio de ensinar e de refletir acerca do fazer docente. Apresenta olhares coletivos sobre o fenômeno e com isso amplia nossa compreensão sobre ser professor. Muito mais que isso: evidencia a importância de programas de formação docente como a RP e o PIBID, bem como ressalta a importância dos estágios supervisionados na construção do perfil pesquisador dos egressos de cursos de licenciaturas, capazes de dialogar as teorias estudadas com a prática da sala de aula. Por tamanhas contribuições acadêmicas e sociais, caro leitor, este livro é mais que um mero estudo sobre “formação de professores”. Por tudo que representa, sua leitura é mais que sugerida; é aconselhada.
Dr. Israel Elias Trindade
Professor da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás (UFG)
Pró-Reitor de Graduação da UFG
Ano de lançamento | 2022 |
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Número de páginas | 102 |
ISBN | 978-65-5869-803-6 |
ISBN [e-book] | 978-65-5869-804-3 |
Organização | Alita Carvalho Miranda Paraguassú, Silmara Barbosa Alencar |
Formato |